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16/06/2012

DIVINA PROVIDÊNCIA


Divina Providência
Ia um touro velho
De tempo bem contado
Se arrastando... Aos trancos!
Já quase que finado

E um bando de urubus
Que andava esfomeado
Seguia bem perto
Do almoço requintado
Também ia a morte
Em tão boa companhia
E o boi nem ligava
De olhos fechados ia
Só tinha certeza
Que logo morreria
Por isso dava adeus
Mas mugir não mugia

E o bando de urubus
Que ali se reunia
Chamava algum garçom
Mas ninguém respondia
É que a dona Morte
Por zelo ou por capricho
Guardou sua foice
E não quis montar no bicho

Mas ninguém do bando
Sentiu-se incomodado
Do boi reservava
Cada qual seu bocado

Que doesse a fome
Ninguém se preocupava
Pois sabiam que o boi
Dali não escapava

Como quem pede ao céu,
Porque nega a Ciência
Pareciam clamar
A Deus por providência
 
Do céu veio a chuva
E tão forte que ela foi
Levou quase tudo
E ceifou também o boi
Porém todo bando
Sem pressa de comer
Abriu suas asas,
Mas sem nada fazer
Um jovem tucano
Que a tudo assistia
Olhava os urubus
Não se aguentava e ria
Seres inferiores”,
Dizia-se o bicudo,
“Em tudo olham Deus
E enxergam Deus em tudo

Não veem que a chuva
Foi coisa tão normal
Molhou-nos a todos
O que é algo natural”

Contudo, mesmo assim,
Ninguém se incomodava
Mesmo a céu aberto
O bando todo esperava


De asas estendidas
Como quem agradece
Depois dá glória a Deus
A tudo que acontece
Porém, o tucano
Entendia a natureza
Sabia, não foi Deus,
Quem fez a gentileza

Por isso decidiu
Pregar uma lição:
Tirar dos urubus
Aquela refeição

Lá se foi na frente
E nem mal tocou no prato
Veio um fazendeiro
E lhe encarcerou de fato
O bando de urubus
Ao final da confusão
Secou bem as asas
E fez a refeição

Toda a gente de fé
Vai tão irracional
Supõe ver sempre deus
No mundo natural

Mas há também ateus,
Piores que isso até
Por todos têm fies
Supondo em todos fé

Vão como o tucano
Sem se secar primeiro
Morrem na gaiola,
Vivendo prisioneiro

O bando de urubus
 Deixou-nos a lição:
Secam se as penas
Antes da refeição!


O LÁPIS VELHO E A CANETA TINTEIRA


O LÁPIS VELHO E A CANETA TINTEIRA
Foi um lápis corroído
Por azar cair ao lado
De uma caneta tinteira
Das mais caras do mercado
E assim brada a presunçosa
Para amiga caderneta
“Esse ao certo desconhece
Qualquer coisa de etiqueta”

O lápis sem se dar conta
Em sinal de cortesia
Inda vira-se de lado
E vai desejar bom-dia

Mas nem mal ele abre a boca
E a caneta vai e cala
“A visão já causa afronta
E essa coisa ainda fala?”
Mesmo sem compreender
O que estavam a falar
Inda assim o velho lápis
Procurou se desculpar

E a caneta, irredutível,
Nem quis lhe dar atenção
“Porque mão que nos segura
Nunca foi a mesma mão 
“O que fala não se escreve
E o que escreve, é certo, apaga
Pois não passa de rascunho
Não se vende… ninguém paga!

“Quanto a mim, sou diferente
Minha tinta é tão durável
Pois enquanto os homens passam
Eu permaneço intocável

“Sigo junta do progresso
E simbolizo a vitória
Se eu ainda inexistisse
Nem existiria História”

Antes que a jovem tinteira
Terminasse o que dizia
A trocaram pela máquina
Para datilografia
O lápis consegue apenas
Dar adeus para caneta
Que hoje jaz bem esquecida
Lá no fundo da gaveta

Rã que um dia vira príncipe
No outro torna a virar rã
E jovens que humilham velhos
Serão velhos amanhã


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